quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

«Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo.»
Sophia de Mello Breyner Andersen



Abro as janelas da minha casa. Abro-as todas, não me esqueço de nenhuma.
Deixo o vento ir e vir, entrar e sair sempre que ele quer, como ele quer. Por vezes ele faz-me companhia quando me perco mais em mim que no dia. Quando não me lembro que lá fora, naquele lá fora em que passo mesmo a porta, em que sinto o pé a ponderar no degrau, há montes de vidas a serem vividas, e a minha faz parte delas.
Há dias assim…Em que nada te encanta o suficiente para que te deixes e vás.
Hoje não me deixei, e não te deixei, mas também não deixei o mundo. Agarrei nele e com muito cuidado pu-lo no cadeirão ao meu lado, ofereci-lhe um chá, e pedi-lhe que me falasse de si.
Hoje, não me deixei, e não te deixei, e pus-nos no mundo, só para que conseguisse perceber até que ponto ele foi feito para nós…O que podemos esperar dele, quando as suas forças de rotação diminuem, e ele começa a ceder.
Tenho medo de te amar aqui, neste mundo.
Talvez noutro, me fosse simples dar-te o meu coração numa caixa de cartão com uma fitinha acabando em laço, e numa cor suave como o amanhecer. Talvez noutro mundo...não neste.
Neste mundo tudo nos empurra, e tudo nos puxa, e nada nos liberta, ainda que sejamos livres,
Onde tudo é demasiado ténue para chegar a ser alguma coisa. Onde o tempo passa sempre demasiado rápido para ti, e demasiado devagar para mim.
O problema mesmo, falou-me o mundo, é de existirem mais mundos no mundo. "Mas para ti que és pequena, devo dizer-te que o que te faz andar meio perdida, encontrada num lugar onde nunca te poderás totalmente encontrar, é os vazios entre os mundos."
São as grandes distâncias de vazio e nevoeiro, onde nada te parece límpido, e onde corres sempre o risco de embater contra arranha céus, ou coisas dessas duras e baças, percebi.
E ficámos em silêncio o resto do tempo, enquanto o dia passava, e me chegavam em tom de som de fundo de memórias, os barulhos do afã das vidas (e dos mundos) que arrastavam os pés lá fora...
Então, neste acesso de limpidez de pensamentos momentânea, juro que não sei em que mundo tenho medo de te amar. Não esperava que existissem mais mundos, nem esperava que entre eles existissem vazios.
Sempre me pareceu fácil amar os outros. O amor foi-me fácil na medida em que o sentia. Já me foi doloroso, já me foi injusto...Mas difícil, ele nunca foi. Nunca me assustou, nunca me fez arregalar os olhos e nuunca me acelerou a respiração.
Se me debruçar sobre mim, em género de criança que se debruça sobre os gradeamentos de uma janela, com a curiosidade a saltar-lhe do olhar, consigo ver agora dois mundos dentro do mundo.
Quando olho para o meu, acho difícil de to mostrar e que o percebas como tantos se esforçam para o fazer...Porque ele é uma complicação de caminhos, tão depressa tão limitados, como ilimitados.
Mas quando viro a minha face para o teu, quero fugir. Quero desatar a correr e trazer-te comigo, porque ao mesmo tempo que tenho medo de entrar, tenho medo de te deixar aí. Ele é demasiado simples, e na sua simplicidade, demasiado perigoso.
Enquanto me decido se te puxar, se me empurrar, ou se deixar que fiquemos assim misturados com tanta coisa, vou ficar aqui. Vou levar parte de ti comigo, e garantir que levas parte minha contigo.
Tenho medo...Medo de te amar, neste mundo...Nestes mundos, que são tão pouco, ao pé de nada, e nos saltam á vista e ás decisões como se fossem quase tudo.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

O risco de acreditar, de amar.


Eu quero dar-te a mão, deixas-me?

Deixas que eu te pegue por um dedo, e te faça correr lá para fora, onde as estrelas brilham dançando na noite?
Tenho medo que ainda não percebas, que eu não te quero só porque preciso de ti. Eu quero-te sim, porque também tu precisas de ti, e eu quero levar-te a ti.
Quero que conheças o teu caminho, e não o caminho daqueles que te puxam, e te fazem andar aos encontrões nesta vida.
Vá lá, deixa-me levar-te!
Tenho medo, mas a mim ele não me consegue parar, percebes? Agora és tu, e eu não consigo deixar de te guardar debaixo da minha manta de carinho, eu não consigo mostrar-te um lado rude, que até não tenho. Não consigo inventá-lo para ti, porque eu não quero que aprendas esse lado, mas que o desaprendas. Que o deixes, como um vício antigo de que não mais te lembres.
Eu parei para te ver. Parei para ficar de frente para ti, para te olhar nos olhos e para te fazer ver. Não podes tu parar também por mim? Não podes tentar abrir os teus olhos, para me ver? Para realmente me ver, sem que antes vejas tudo o que nos rodeia?
E se não consegues olhar para mim, não podes então fechar os olhos e sentir-me?
Sentir-me em toda a simplicidade, em tudo aquilo que a tua afeição pelo mundo não te deixa ver. Deixa-me dar-te a mão, pode ser? Agarra a minha fortemente, agarra-a porque eu quero que fiques seguro.
Mas será que não achas já que o estás?
É quando me parece que estás bem como estás, e que não achas que nada deva mudar que acredito que todo esta espécie de plano, todo este meu risco de amar, não vai passar de uma loucura sã, que me vai magoar mais, que me fazer sorrir.
E agora? Eu não consigo deixar de te guardar de uma só vez, e depois e te trazer aos pedacinhos para a minha mente, onde te saboreio devagar, tentando decidir a que sabes.
O que és.
Eu tenho medo que as minhas palavras te soem a piada. Tenho medo que os teus olhos não estejam fechados, mas cegos. E por mais que eu te tente fazer perceber que te quero um bem carinhoso, com um amor arriscado, dá-me sempre a sensação que o meu sentimento e a minha intenção é uma brisa de final de tarde a passar por ti.
Eu ainda não te aprendi, mas não me canso de tentar e voltar a tentar. Porque eu não consigo desistir de ti. E não conseguiria desistir de ti, mesmo que tu desistisses de mim. E não conseguiria desistir de ti, se as tuas palavras fossem facas, se o teu sentimento fosse agreste, que a tua mão fosse fria e dura.
És a maior das minhas complicações agora, porque podem ser tanto a simplicidade mais simples, como a dificuldade mais difícil. És sempre algo inconstante, vejo-te de lado para lado, e a minha boca fecha-se numa linha desanimada.
Volta a doer um pouco…Ficas por ali ente mim, entre o meu nirvana e nunca sais.
Eles dizem que ainda me vou magoar, que não mereces. Mas eu não paro de gritar para comigo que por vezes, só precisamos que acreditem em nós.
Mas talvez nem precises, nem queiras, nem consigas, nem possas acreditar em mim, como acredito em ti.
Mas talvez nem precises,nem queiras, nem consigas, nem possas dar-me a mão, ver-me, sentir-me.
É o risco de amar, de acreditar.
Deixas-me acreditar?
Consegues ver esta verdade toda agora? Consegues senti-la?
Então, deixas-me dar-te a mão, pequeno?