sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Dia Mau.








Eu preciso que pares. Preciso que pares de parar de me fazer ficar aqui.
Preciso que pares de parar de me fazer ir sempre que me vês as malas á porta, o coração nas mãos,
e a maior determinação, mais cheia de medo que de bravura, no rosto expectante.
Mas em que parte da minha vida não tive eu medo? (E em que parte dela é que tu percebeste que era mesmo medo?)
O medo esteve sempre lá, para além do medo normal que todos sentem. Eu sempre senti mais medo.
Mais medo de sentir mais medo, e mais medo, e mais medo, muito mais medo de tu nunca chegares
a perceber que era medo.
E o medo pareceu-me sempre mais adequado que o que dizem de mim.
E isso talvez tu tenhas percebido, e tenhas gostado de perceber.
Eu lembro-me de quando tudo o que me rodeava era simples. Agora, sempre que me vejo mais rodeada
menos rodeada me sinto. Porque na verdade é só isso. Eu estou só rodeada, e não passa
desse aglomerado de pessoas á minha volta.
Se estás aí, e eu sei que ainda estou aqui, devo dizer-te que nunca me senti tão sozinha.
E talvez que de sentir que o estou, só a palavra me faz chorar, aqueles choros típicos da miúda que conheces.
É uma palavra tão triste, não achas?
Vejo-te a dizer-me para reagir. E eu desta vez digo-te que não posso.
Não posso reagir ao que não tenho. E o que é que afinal eu tenho a não ser a sensação
de que tenho tudo dentro de mim? E isso é muito pouco, porque tudo começa a desbotar e a tornar-se
nessas dúvidas de quem olha para lá fora e vê um sol radiante, enquanto cá dentro chove.
Esta chuva é fria, só para que saibas. Tu que tanto gostas do Inverno, foges desta chuva
como o ladrão foge á polícia. Sabes que podes fazer o sol nascer aqui, e querendo-o não o consegues,
porque é difícil,porque nós prometemos que não iríamos conseguir tal coisa mutuamente.
E abreviámos umas quantas situações em que só precisávamos de silêncio e a certeza que de estaríamos
seguros um com o outro.
Acho que é deste ponto que se fica em branco, sabes. Quando não consegues conciliar os pensamentos
dentro da cabeça, quando eles se tornam pesados e mais presentes que o próprio presente.
E para te dizer a verdade eu tenho saudades de tudo.
Tenho saudades de ter umas saudades mais verdadeiras e exclusivas que estas. Umas
saudades que me lembrem alguém, uma imagem nítida, e não estas saudades que englobam muitas coisas
misturadas, como plasticina de várias cores amassada por uma criança.
Mas o que mais me tem feito chorar é o olhar de longe para o panorama de pessoas que já perdi. E até poderia achar incrível, essa ciência estranha que nos torna as pessoas que melhor conhecemos em completos desconhecidos. Já tinhas pensado nisto? Choras-te? É tão estranho, faz tantas cócegas nas cavidades do coração. As minhas começaram a rir a semana passada, e de tão cansadas pediram-me para fazer "reset" ao meu sistema.
Era uma boa solução não achas? Mas por outro lado acho que não poderíamos ter um botão assim, pois nunca conseguiríamos chegar até meio de uma vida. Logo no inicio já estaríamos a carregar novamente no botão, isto é, se tirássemos de lá o dedo. E depois lá fugiam, entre as erradas, as vezes em que começamos bem. E depois ninguém começava.
Não posso deixar de dizer que é uma ideia tentadora.
Agora sabia bem um abraço. Um abraço apertado, que me fizesse chorar ainda mais. Uma abraço apertado daqueles que dizem: "És uma idiota, fazes tudo mal, e não tens piada nenhuma, mesmo quando tentas ter.Mas mesmo assim, eu gosto de ti."
Há dias em que ouvir isto chega. Hoje é um dia desses.
Eu preciso que pares, antes que seja eu a parar. Porque quando eu parar, não poderei nunca retomar mais nada. E de cada vez que me quiser lembrar de ti vou ter de me lembrar que não te posso lembrar, e nunca vou deixar lembrar-me toda a vida que me davas, quando eu exalava morte.
E eu tenho saudades tuas.
E tenho saudades de toda a gente.
E tenho saudades de mim, de ter a certeza que vou ter uma estrada, com pedras, mas uma estrada direita para continuar a seguir.
Se estás aí, e eu sei que ainda estou aqui, devo dizer-te que nunca me senti tão sozinha.

3 comentários:

  1. « Eu sei, a tua vida foi marcada pela dor de não saber aonde dói, mas vê bem, não houve à luz do dia quem não tenha provado o travo amargo da melancolia. »
    Este era um texto que eu poderia ter escrito à uns tempos atrás, até me arrepiei quando o li.
    Tu és uma pessoa bonita, Inês. Não te deixes consumir por tanta dor. Força aí, pequenina. *

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  2. gostei do teu blog. se quiseres passa pelo meu: www.diogocalado.blogspot.com

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  3. são esses dias que nos fazem aperceber que preferíamos o calor da felicidade ao frio da saudade do que fora outrora a felicidade.
    escreves bem, gostei muito de ler!

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