sexta-feira, 26 de março de 2010

Uma vontade de ir...

" Vai quem já nada teme..."


Faz silêncio e escuta os passos suaves do medo a ir embora. 
Ele já não tem força, a consistência necessária para te rodear os braços da vontade e do querer.
Olha para o horizonte e sente o ar a ficar mais leve e mais livre...Os teus pulmões conseguem agora armazenar mais oxigénio.
E apetece-te correr, saltar, gritar ao mundo que  te transformaste em onda rebelde no meio do mar calmo, que és agora uma nuvem fugidia no céu azul límpido. 
Fecha os olhos e concentra-te no teu corpo...sentes todas as veias a cantar a pulsação dos movimentos suados, e dos toques mágicos.
E ele diz que é especial, que há-de sempre ser especial. 
E ele enxota o medo, sem precisar sequer de lhe bradar ruídos como se faz aos gatos.
Tu vais. Não te deixas apenas ir, não vais pela força da corrente, mas caminhas pelo teu pé. Queres chegar ao seu cheiro, queres encontrar o seu calor. Vais...porque queres, porque precisas.
E cegas, e ensurdeces, e ficas muda. E vês tudo muito mais nítido, e ouves até o suspiro mais imperceptível das sombras do canto do quarto, e saem-te mil sons sem sentido, que querem dizer tanto mais que as palavras com sentido que passaste metade da vida a dizer.
Murmúrios adormecidos amanhecem no teu corpo e a tua pele contai-se em gargalhadas sonoras, envolve-se em arrepios crepitantes, sibila ânsias...
E se a tua atenção não morrer por completo, e se conseguires olhar para ti no momento antes de deixares a bebedeira dele atingir-te no centro do peito, podes ver que o medo foi embora...Podes vê-lo a acenar-te, e a seguir o seu caminho.
Agora és tu. E estás tu. E vais tu. Não tens a certeza do que espera, mas sabes mais do que nunca que queres chegar ao outro lado de ti, e que só ele pode ir contigo. 
Os portões abrem-se, a brisa das suas mãos entra e balança-te os cabelos. Brinca com a cor dos teus lábios, prende-se na cor dos teus olhos, e tu sentes-te cair naquele quase verde demasiado imperfeitamente perfeito dos seus. 
Ali pensas ver o resto do mundo. Dali vês o mundo inteiro. Todos os edifícios, todas as luzes, todos os carros, as ruas, as floristas, os parques, os velhos nas esquinas. 
Ali, sentes tudo. Ali tudo entra em ti como droga, e te consome. E te parece fantástico. E te parece não ter fim...
Como um espectáculo interminável de sensações, como o desfile da vida mesmo embaixo do teu nariz.
E não lhe tocas ainda, mas estás bem ali, onde estás. Donde vês o mundo, onde sentes tudo, onde tudo te toca e te delicia. Te prende e te liberta.
É ele, e tu agora vais. 
É ele...e tu corres cada vez mais para si. Para tudo aquilo que ele tem. 
E vais,e vais, e vais...e ele abraça-te e alicia-te mais.
Talvez amanha tenhas que voltar para trás...
Mas hoje vais...e vais...e vais...como quem já nada teme.



" E uma vontade de rir
Nasce do fundo do ser...
E uma vontade de ir...
Correr o (teu) mundo e (não) partir..."


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