terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Conversas com o mar...


As chamas consomem o papel empestado de palavras outrora racionais.
Hoje tornaram-se tolices. Hoje tornam-se tolices.
Vejo-as desaparecerem como pequenas aranhas a fugir para lá de uma coroa amarela alaranjada que avança sem cessar…depressa são cinzas. Cinzas leves, juntas num monte de vidas passadas que se enfeixaram na minha.
Imagino o fogo ardente deitar um suspiro de saudade em forma de fumo preto e seco…Como quem diz: Acabou!...
Mas não, isso não acontece…
O gato ronrona do lado direito do meu corpo, e enrosca-se mais no sofá cada vez que lhe afago o pêlo em trejeito de carícia.
Se ele soubesse a sorte que tem…
Se ele soubesse…
E se eu soubesse…se eu soubesse aquilo que ignoro.
Que todos ignoramos.
Por vezes gostava de ser uma rocha. Rocha daquelas perdidas numa imensidão de minúsculos grãos de areia da cor das torradinhas, antro beijado aos pés pela gulosa senhora dos mares; a água salgada, de pose mais doce exultando um azul leve e despercebido.
Uma rocha que não sente.
Uma rocha que não precisa de saber como agir, ou quem vai afectar.
Uma rocha que vive em paz, num ciclo de libertação continuo e descansado.
Não tem de correr pelas ruas para chegar a horas.
Não tem de falar alto, nem baixo. Nem tem de falar. Ainda assim, tudo tem uma voz.
Fshhh…Fshhh…Fshhh…
Brada ao mar…e ele avança.
Que diz ela? É capaz de nunca se chegar a saber, mas é calma e ponderada.
Estou aqui, perdida entre estas ilusórias imagens de dias nunca vividos. Estou aqui, fraca entre as razões e os acontecimentos.
Para tudo existe uma razão.
Pensei estar doente. Pensei precisar de um sofá onde me sentar, de uma cama onde me deitar quando senti as pernas tremerem como canas de açúcar aquando o enlace com o sopro da manhã…Quando senti a minha garganta tropeçar nas palavras e estas me atacaram como pequenas agulhas, quando as minhas costas latejaram, tal como a minha cabeça numa súplica de ar quente.
A vista estava qualquer coisa como que desencontrada da realidade…
Mas não precisei da cama, ou do sofá.
Continuei firme, sabe-se lá como.
E a doença não se via, apenas se sentia. Como aqueles estados terminais em que sabemos que está mesmo, mesmo a chegar mas que ninguém nota.
Pudera…como andam as pessoas de olhos postos no mundo, nas coisas materiais! Não conseguem ver para além da imagem…
E, há certos momentos, em que gostava que comigo fizessem isso. Se ficassem pela minha imagem, pelo meu sorriso leve, pela aparente e suave felicidade.
Me deixassem ficar pelo mar. Atravessá-lo como um peixe rejubilando de liberdade…
Em sonhos acordados, olhei-o com vergonha, e fiz-lhe uma pergunta que ele achou desleal…Uma pergunta que não deveria ser pergunta, mas um ponto de determinação para descobrir a resposta. Uma pergunta retórica.
«Morre-se de amor?»
Afinal eu sabia a resposta.
Vi-a passar na minha frente com as gaivotas. Vi-a estreitar-se no cabo e acabar por desaparecer, querendo, talvez, que eu corresse feita louca atrás dela.
O facto é que já não tinha urgência em saber tal coisa.
« Ninguém morre de amor levando o corpo. Morre-se com a alma.»
Isto, soou-me mais estranho que o zumbido que nos amaldiçoa antes de perder os sentidos. Morre-se com a alma…Morre-se por dentro, como uma flor, como um desenho animado, mas por um processo menos acentuado.
No final fica um tudo de nada…um “poucachinho” de disto e daquilo e ainda do outro, com um muito personalizado do que já foi.
O amor é subtil e envergonhado. Esconde-se…Assim é a sua morte.
Começa com uma sensação de que nada é assim tão mau (que mentiroso ele é…), que se pode aguentar a dor. Em seguida ataca-nos de quando em vez, gravando a ferro e fogo SAUDADE no nosso coração (um epitáfio seguro…), depois vem o desinteresse por um mundo cheio de cores e ruídos e novidades…Por último vêm as dores, o puder ficar eternamente sem fazer nada e não sentir aborrecimento, o pensamento que nos diz que estamos a enlouquecer…e a cor que começa a abandonar-nos.
«Que arroxeado tão pálido, esse dos teus lábios!»
É da…vida. É do frio que faz na rua ventosa das minhas recordações e das coisas desconhecidas.
«Hum…»
«Não penses mar, não penses…Não tentes encontrar uma solução desmesurada.
Não arrisques um diagnóstico, médico não és…e não me apetece olhar-te de revés, como uma notícia pouco segura, como se tivesses uma alma desperdiçada…
Ho meu Deus…que vontade é esta de fechar o livro, de o queimar…de fingir que esta história nunca existiu e penetrar como faca o luar.»
«Não te percas, menina…Não te canses…A vida é uma prova de força e eu espeto que avances…
Não te deixes ficar, menina…Não te escondas…O mundo é um lugar fantástico se o conseguires apreciar…»
«Ó mar…mar…o que é a felicidade? De que falas tu com toda essa seriedade…?»
«Será que não sabes o que te vou dizer? A felicidade é aquilo que tu a quiseres fazer ser!»
« E se precisarmos de alguém para sermos felizes?»
«Essa pessoa estará lá…»
«Mas ela não está mar…ela não está!!!»
«E estás infeliz?»
«Parece-me tanto que sim…e apetece-me gritar que não. Quero partir, mas está preso o meu inseguro coração…»
«Menina…menina…Essa dor tornou-se um hábito maldito, uma algema no teu lugar mais recôndito…algo que te conhece e sabe como te atacar…algo que te faz cobarde ao ponto de não te quereres encontrar!»
«O medo??...»
«Aquele que sentes quando á noite te perguntas como podes voltar a amar…Como será voltar a sorrir, quando pensas pôr o teu coração novamente a bater…E quando te confronta o medo de pagar pensão no teu ser, o Sr.Sofrer!»
Olhei para baixo, senti-me corar…
Onde estava eu, para ter medo de me encontrar?
Sentia-me pequena, dentro de uma caneca de chá pronta a ser inundada por um cheiro demasiado doce, demasiado viciante…demasiado enjoativo…
Não precisava de o ouvir para concluir, porque razão eu teria medo de admitir…
E por vezes as palavras são sábias de mais…E há momentos em que a verdade é dura que chegue e sobre…
No fundo somos todos iguais, quando sentimos o que outros sentiram…
E hoje, agora, nesta precisa hora, eu já sei responder á pergunta que fiz um dia, á qual responderam com um olhar azedo e um olhar marejado de ressentimento…
- Porque é que tens medo de amar??? Porque dizes tão mal do amor??
Mentalmente as palavras aparecem como a teoria de aparecimento do universo: fenómeno de big bang na minha mente!
«O amor é injusto quando o outro não o sente. É amargo quando rejeitado. É enjoativo quando não apreciado. É rude quando não percebido. É escasso quando definido. É infiel quando fraqueja. É fraco quando está sobre longevidade. É morto, quando sentimos falta de sentir saudade. E é temido quando se marca em alguém que já o tenha sofrido!»

1 comentário:

  1. A superficialidade da sociedade enoja-me.

    Se aos menos as pessoas soubessem o que andam a perder por não conseguirem ir além de uma imagem...

    É tu tudo oco, é tudo vazio, é tudo "coisas".



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